O Arcano da Sabedoria, da Gnose, do Princípio Receptivo
Compilação de Constantino
K. Riemma
Uma mulher sentada, com um livro aberto sobre a saia e uma
coroa tripla na cabeça.
Olha para a esquerda e veste uma túnica vermelha sobre a
qual se desdobra um manto azul (em algumas versões as cores são opostas). Duas
partes da sua tiara estão ornadas de florões, mas a parte superior é uma
simples abóbada. Um véu, que lhe cai sobre os ombros, cobre totalmente os seus
cabelos; na mesma altura desse véu, por trás, aparece uma cortina cujos pontos
de fixação não são visíveis. Tampouco se podem ver os pés da mulher, assim como
a base do trono.
Fato curioso, que é reencontrado somente no arcano XXI, é
que a figura ultrapassa a margem superior do quadro: o extremo da tiara supera
a linha negra, um pouco à direita do número II.
Significados simbólicos
A Sabedoria, a Gnose, a Casa de Deus e do homem, o
santuário, a lei, a Cabala, a igreja oculta, a reflexão.
Fala também do binário, do princípio feminino, receptivo,
materno. Mistério. Intuição. Piedade. Paciência, influência saturnina
passiva.
Interpretações usuais na cartomancia
Reserva, discrição, silêncio, meditação, fé, confiança
atenta. Paciência, sentimento religioso, resignação. Favorável às coisas
ocultas.
Mental: Grande riqueza de ideias. Responde a problemas
concretos melhor do que a questões vagas.
Emocional: É amistosa, recebe bem. Mas não é afetuosa.
Físico: Situação garantida, poder sobre os acontecimentos,
revelação de coisas ocultas, segurança de triunfo sobre o mal. Boa saúde, mas
com um ritmo físico lento.
Sentido negativo: Dissimulação, hipocrisia, intenções
secretas. Mesquinharia, inação, preguiça. Beatice. Rancor, disposição hostil ou
indiferença. Misticismo absorvente, fanático. Peso, passividade, carga. As
intuições que traz invertem seu sentido e se tornam falsas. Atraso, lentidão
nas realizações.
História e iconografia
A tradução exata do nome que o Tarô de Marselha dá a este arcano
(La Papesse) é A Papisa. Outras versões, como A Sacerdotisa ou A Alta
Sacerdotisa, vêm do nome que lhe é dado em inglês (The High Priestess).
A figura da Papisa faz alusão a um fato histórico, ou
melhor, lendário, que ocupa um lugar notável na literatura da Idade Média: a
pretensa existência de um Papa do sexo feminino. A tradição popular diz que uma
mulher ocupou a cadeira de São Pedro durante alguns anos sob o nome de João
VIII.
Várias versões aparecem, mas o mais antigo testemunho que
chegou até nós é bastante posterior à data de seu suposto reinado.
De qualquer modo, para o estudo tradicional e iconográfico
do Tarô, não importa estabelecer alguma fidelidade histórica.
Embelezada com o correr do tempo, uma de suas versões
combina admiravelmente com o simbolismo maternal que se atribui à estampa:
segundo tal versão, a papisa teria ficado grávida de um dos seus familiares e,
como não se recolheu à época do parto, o acontecimento teria se dado em plena
rua, durante uma procissão entre a igreja de São Clemente e o palácio de
Latrão.
Com a dramática descoberta do embuste, o enfurecido séquito
papal teria assassinado Joana e seu filho.
Antigas tradições romanas asseguram
que, no lugar do homicídio, permaneceu durante séculos um túmulo ornado por
seis letras P, que podiam ser lidas de três maneiras diferentes (jogando com a
inicial comum a Papa, Pedro, pai e parto).
Ainda com relação a essa lenda, deve-se assinalar um fato
notável: na célebre Bíblia ilustrada alemã do ano de 1533, a grande prostituta
do Apocalipse está representada com uma tiara na cabeça, A tradição afirma que
foi desenhada deste modo por desejo expresso e sugestão de Martinho Lutero.
Enquanto o Mágico não poderia permanecer em repouso (numa
unidade andrógina onde tudo é impulso e estímulo), a Sacerdotisa é o próprio
repouso: sentada, majestosa, receptiva, seu reino é binário, uma etapa na
distinção da polaridade do universo. Se o binário equivale a conflito, no
sentido de rompimento da unidade, de abandono do caos essencial onde não
existem as magnitudes nem os nomes, é também a primeira etapa dolorosa e
imprescindível das vias iniciáticas, o começo da busca da identidade.
A Sacerdotisa representa a submissão majestosa às exigências
dessa iniciação, o equilíbrio que a repartição elementar de forcas produz no
conflito.
O que o Arcano I era para a encarnação das energias
espirituais o Arcano II o é quanto à aceitação dessa metamorfose: o
reconhecimento prévio da luta entre os princípios branco-negro, dia-noite,
Yang-Yin.
Alguns autores veem na Sacerdotisa a representação de Isis,
com todas as suas conotações noturnas e ocultas. Também a associam a
Cassiopéia, a rainha negra da Etiópia e mãe da constelação Andrômeda, e a
Belkis, a belíssima rainha de Sabá, para quem Salomão teria composto o Cântico
dos Cânticos. Essa relação da Sacerdotisa com deusas e rainhas negras (ou
escuras) não parece casual e acentua a contrapartida com a carta a seguir: o
simbolismo branco, luminoso e diurno do Arcano III (A Imperatriz), com quem a
Sacerdotisa forma a dupla oposta e complementar da feminilidade.
Este símbolo subterrâneo, que se refere ao aspecto esotérico
da revelação, teria passado para o cristianismo sob a forma das virgens negras,
cujo ritual se realiza com frequência numa cripta ou num lugar inacessível.
Mãe, esposa celeste, senhora do saber esotérico, a Papisa ou
Sacerdotisa ocupa na estrutura do Tarô o lugar da porta, da passagem entre o
exterior e o interior, do ponto imóvel e comum entre a Casa e a rua.
Fonte: http://www.clubedotaro.com.br/site/m32_02_papisa.asp